segunda-feira, 18 de abril de 2011

Verve literária de um jovem autor


Irreal

Por Pietro Tarantelli

Benigno se sente confuso e ofuscado. Vê Suzana estripada no chão, com o sangue brotando a jorros e lhe parece que tudo é irreal, que não foi ele que meteu dois caroços em sua ex-namorada, aqui no estacionamento do supermercado. Quem diria que toda aquela felicidade vivida por eles acabaria desse jeito, com uma carnificina absurda.
Quando a conheceu e começaram a sair juntos, mal podia acreditar na sorte que tinha.Ele, um velho de quase 60 anos beneficiando-se de uma doce e bela jovem de 37. Desde que havia se separado de sua insuportável esposa, tinham sido anos duros e tristes para Benigno. Até que apareceu naquele clube... Que mulher monumental! Foi como um sonho. Simplesmente não reconhecia a si mesmo. Era outra vez o macho de suas melhores épocas, trepando sem parar com Suzana, fazendo-a mais e mais feliz, sentindo seu corpo excitante esvaindo-se entre suspiros apaixonados. Parecia algo irreal. Mas era verdade.
Um zumbido assobia em seus ouvidos. O barulho dos disparos o deixou momentaneamente surdo. Não ouve as pessoas gritando assustadas e os carros circulando no estacionamento. Sua confusão se manifesta como uma espécie de corrente elétrica que percorre todo seu corpo e provoca um ligeiro tremor, que não lhe impede de descarregar os cartuchos utilizados contra Suzana.
Quando ela lhe disse que tudo havia terminado, assim, de repente, teve um estalo. Não demorou a descobrir a causa. Ela estava saindo com outro, um maldito filho da puta, mais jovem do que ele... 30 ou 30 e poucos. Era o fim, mulheres como Suzana, na sua idade, não iriam cair em seus encantos.
Que distantes pareciam os tempos em que ela se mostrava carinhosa e sensual, solícita aos seus pedidos. Os tempos em que irradiava essa juventude que tanto o atraía. Imaginou-a velha. Apareceram todas essas rugas e marcas que o amor dissimula. Afinal de contas, uma mulher de 37 anos não é nenhuma menina.
Agora, ela esta aí jogada no chão,em uma poça de sangue e com as tripas para fora. Rígida e flácida,como uma boneca quebrada
Alheio a tudo que o rodeia Benigno introduz dois cartuchos novos na arma enquanto se apóia na parede. Lentamente, vira a espingarda em sua própria direção, agarra com uma mão o cano duplo e com a outra começa a pressionar um dos gatilhos.
BLAM!!
Com a confusão do momento, Benigno comete o erro de não introduzir o cano em sua boca – por medo – e só consegue que o tiro acabe com seu queixo, lábios, nariz e um olho, desfigurando-lhe a cara completamente.
BLAM!!
O segundo tiro não faz nada além de insistir no erro do primeiro, arrebentando o olho bom e terminando o trabalho de destruição de sua cara, sem causar o dano suficiente para que Benigno caia sem sentidos. Apalpando o peito, comprova com surpresa que continua vivo e de pé. Ele então retira uma faca do bolso interno e reunindo forças a enfia no pulmão esquerdo com um golpe seco.
TCHACK!!
Completamente sem sentidos, Benigno toca o peito e sente a faca afundada. Não compreende porque continua vivo e de pé. Instintivamente, extrai o objeto pungente de seu corpo, banhado de sangue e novamente crava o aço, desta vez no estômago, com outro golpe seco.
TCHACK!!
Agarrando com força, Benigno revolve a lâmina da faca em seu interior e repara como suas vísceras se contraem e se dilatam, desfeitas pelo fio cortante da arma. Benigno não cai. A vida resiste em abandoná-lo. Retira outra vez a faca enquanto sente o sufocamento provocado pelo pulmão destruído. Sem forças para segurá-la, a faca cai no chão, e Benigno fica desarmado e sem poder concluir seu suicídio. Um menino olha assustado, e, ao mesmo tempo, intrigado.
- Daniel! – grita uma mulher – Sai daí!!
- Mãe... O que este senhor tem? – pergunta o jovem.
- Não olhe!! – Ordena a mãe, ainda mais assustada do que o filho.
As pessoas rodeiam o moribundo e assistem em silêncio ao espetáculo macabro. Alguém do grupo filma a cena horrível e de noite Benigno será famoso por todo o país ao aparecer nos noticiários da TV enquanto as famílias jantam em suas casas. Uma angústia gelada se apodera dos telespectadores durante alguns instantes e logo em seguida continuam engolindo seus jantares sem saber que nesta noite muitos deles terão pesadelos densos e vermelhos que irão ressecar suas gargantas e envelhecer um pouco mais seus espíritos.








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