terça-feira, 5 de julho de 2016

Hélio Bicudo, 94 anos depois


Hélio Bicudo faz 94 anos hoje. Sem demonstrar a idade que tem e com muita disposição está na linha de frente do processo que visa o afastamento da presidente Dilma Roussef. Em 2005, onze anos atrás, ao deixar o PT, após longos anos de militância no partido, ele avisou: “O PT nasceu como um partido socialista, criado para atender às necessidades populares. Ao longo dos anos, passou a ser o partido de algumas pessoas que buscam o poder”.
Mas para aqueles que nunca se deixaram se encantar totalmente pelo canto da sereia, o PT desde o seu início tinha os seus vícios de origem. Nasceu de um artificial pluripartidarismo, estratégia do regime militar para dividir a oposição, que se mostrava forte e aglutinada em um único partido de oposição.
O partido tinha uma áurea de sonhos, se mostrava como o novo e para ser construído precisava de um certo encantamento e de um verniz de esquerda. Com o passar dos anos, muitos dos que se deixaram iludir, despertaram do sonho.
Mas muitos ainda não acordaram depois de passada a névoa entorpecente. Ainda acreditam que o símbolo do atraso representa a esquerda. Um partido que afundou na corrupção, como percebeu Hélio Bicudo, para quem o PT, hoje, se resume ao Lula e a alguns outros que o utilizam para os seus projetos pessoais. É um partido autoritário, afirma o jurista, citando o seu  presidente Rui Falcão, como exemplo.
A corrupção, com a qual muitos dos dirigentes se locupletaram uns sob pretexto de desenvolver um projeto de poder permanente outros em benefício próprio, para Hélio Bicudo está nas grandes fortunas e na maneira como elas foram construídas. Como dizia Heráclito, “nada é permanente, apenas a mudança. Lula, segundo o jurista vivia em uma casa de 40 m2. Se tornou rico, assim como seus filhos.
Hélio Bicudo, afastado e crítico da atual estrutura partidária, afirma que o afastamento de Dilma se deve à luta do povo e não pela interferência dos partidos políticos.

Mudar não é demérito

O povo brasileiro foi às ruas para repudiar a cleptocracia comandada pelo PT, afirma o jurista, que inicia sua trajetória política com alguma atuação política dos tempos de estudante de Direito.
Terminado o curso, ingressa por concurso no Ministério Público. Por influência de amigos, se aproxima da UDN como simpatizante da sigla de viés histórico conservador, mas que na época, segundo Bicudo, representava a volta da democracia após a ditadura Vargas.
Partido mesmo, só se filiou ao PT e nele permaneceu durante 25 anos, até setembro de 2006, quando decidiu sair,  mesma época da desfiliação de Plínio de Arruda Sampaio (1930-2014), que também havia ingressado com ele na mesma cerimônia de filiação à sigla.
Ao contrário do que se afirma, Bicudo não é um dos fundadores do partido e a ele se filia somente depois de sua fundação. O mensalão é a gota d’água para a sua saída.
Esse é o segundo pedido de impeachment feito pelo jurista e se o desfecho for a perda definitiva do mandato de Dilma ela será a segunda presidente da República afastada com a contribuição de Hélio Bicudo. É dele e de Lula, o primeiro pedido de impeachment de Fernando Collor, que, ele considera o estopim para a deposição do ex-presidente.
Bicudo também havia ingressado com uma ação na Justiça Eleitoral contra Collor por fraude nas eleições. O Supremo Tribunal Federal (STF), na época, segurou a ação até depois da posse de Collor como presidente e sentenciou que ele não podia ser julgado por um ato cometido anteriormente ao exercício do mandato presidencial. É o mesmo artifício que o PT utiliza como defesa de Dilma.
Como promotor, no Ministério Público, participara, em 1956, do processo de condenação por improbidade administrativa do ex-governador Adhemar de Barros, que não chegou a ser preso pois fugiu e depois foi liberado por um habeas corpus concedido pelo STF.
Fez parte do governo Carvalho Pinto e o acompanhou quando ele foi nomeado ministro da Fazenda, pelo ex-presidente João Goulart, depois do episódio da renúncia de Jânio Quadros (1961) e da crise que se sucedeu a ela. Carvalho Pinto o convida para ser o seu chefe de Gabinete e Bicudo chega a ocupar a pasta por um breve período de ausência do titular.
Carvalho Pinto deixou o ministério aproximadamente um ano antes do golpe de 1964, que Bicudo avalia como premeditado e patrocinado pelos Estados Unidos, via o então embaixador Lincoln Gordon.
Após o golpe, voltou para o Ministério Público e, nele, atuou contra o esquadrão da morte, no final dos anos 60. O chamado esquadrão da morte, a princípio executava bandidos, mas a partir de 1970  se voltou também para a repressão política.
Ele conseguiu por um breve período a prisão do temido Delegado Fleury, que liderava o esquadrão e já era um contumaz torturador, prática que já utilizava na polícia.
O delegado foi solto por habeas corpus devido a um casuísmo, a promulgação da Lei Fleury, chamada assim porque garantiu a soltura do líder do esquadrão. Bicudo havia sido designado pelo procurador-geral para investigar o esquadrão e conseguiu as provas que resultaram na dissolução do aparato.
Esteve à frente das investigações durante um ano, período em que sofreu muitas pressões e recebeu ameaças de morte extensivas à sua família. Quando estava prestes a chegar aos mentores intelectuais foi afastado das investigações.
De suas experiências surgiu o livro Meu Depoimento sobre o Esquadrão da Morte (1976).  O livro, segundo Bicudo, protegeu a sua vida, pois sem a sua publicação teria o mesmo destino de outros que denunciaram os desmandos do regime.
O próprio delegado Fleury, segundo Bicudo, foi assassinado como queima de arquivo pois bebia e falava demais. Por traz do aparato repressivo, que incluía a chamada Operação Bandeirantes, estava o  ex-governador Abreu Sodré e o seu secretário de Segurança Hely Lopes Meirelles, além de um grupo de empresários de São Paulo, que Bicudo diz não saber quem eram.

No PT

Em 1982, já no PT, foi candidato a vice na eleição para o Governo do Estado disputada por Lula e vencida por Franco Montoro (PMDB). Se candidatou ao Senado, em seguida, e ficou em terceiro lugar, atrás de Mario Covas e Fernando Henrique Cardoso.
Foi secretário de Negócios Jurídicos da prefeita de São Paulo Luiza Erundina (1988), durante um ano e meio, quando saiu para disputar a eleição para deputado federal. Ocupou o cargo por duas vezes. Não quis disputar o terceiro mandato, pois considerava dois já o suficiente.
Em sua carreira política, ainda consta o cargo de vice-prefeito de São Paulo, na gestão de Marta Suplicy  (2000-2004). Diz que aceitou fazer parte da chapa para derrotar a candidatura de Paulo Maluf, mas não foi convidado a participar da campanha pela sua reeleição. A cúpula do partido resolveu colocar Rui Falcão como vice. Marta Supliciy não conseguiu a reeleição.
Foi  ainda presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, em 2000, e diz que no governo de Fernando Henrique Cardoso o Brasil avançou muito nessa área. Lula, segundo ele, não acrescentou nada na luta pelos direitos humanos.
Para Bicudo, a democracia brasileira ainda está em uma fase bastante embrionária, um processo que ainda precisa ser construído a partir de correções de rumo.
O caminho é complicado. Direita e esquerda são termos que hoje não são suficientes para definir uma pessoa, embora Bicudo se considere de esquerda. Para ele, que atualmente é extremamente crítico em relação ao PT, esse partido contaminou as instituições, incluindo o Judiciário, em todas as suas instâncias.
Prega hoje uma reforma geral das instituições, incluindo o Judiciário, desde as suas primeiras instâncias ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF). Afirma que as duas principais cortes do País não serão isentas enquanto os seus titulares forem indicados pelo presidente da República.
Para Bicudo, o impeachment tem caráter educativo e vai influenciar as próximas eleições. A saída de Dilma não irá provocar nenhuma espécie de trauma, segundo seu entendimento. 
Certas opiniões  de Bicudo beiram a amargura e ao desencantamento, principalmente em relação à Lula, que antes chegou a lhe fascinar. Hoje, ele sabe que o líder do PT só quer o poder para benefício próprio.
Hélio Bicudo é um homem vaidoso que está aproveitando a oportunidade para se voltar aos holofotes, afirma o filho, o biólogo José Eduardo Pereira Wilken Bicudo, o quinto de seus sete filhos, dos quais apenas dois estão com o pai.
As críticas começaram a ser feitas após Bicudo aceitar participar da iniciativa de impeachment de Dilma. Mas o clima já se deteriora desde a sua desfiliação ao PT.
Bicudo começou a denunciar o partido por utilizar-se do Bolsa Família como instrumento para a reeleição de Lula. José Dirceu, de que se dizia próximo, foi o primeiro a lhe falar sobre a utilidade eleitoral do programa, que beneficiava 12 milhões de pessoas, mas que rendia ao partido 36 milhões de votos.
Bicudo defende o fortalecimento de uma estrutura que permita mais empregos e sustentabilidade para que a população. O seu desapontamento com Lula surge quando começa a presenciar que o presidente de honra do  PT “esconde a sujeira por debaixo do tapete”. Foi quando participou de uma comissão interna do partido para apurar as denúncias de Paulo de Tarso Venceslau. Segundo o denunciante, o compadre de Lula, Roberto Teixeira, vinha utilizando o nome de Lula para as suas negociatas. A comissão é dissolvida e o denunciante expulso do partido.
Bicudo começa a refletir sobre os amigos de Lula, desde Roberto Teixeira, que cede sua casa para o ex-presidente morar, a Paulo Okamoto, que justifica dinheiro ilícito como um empréstimo a Lula, sem que este se sinta obrigado a devolver. Lula passa a ser comparado por Bicudo a Adhemar de Barros, a quem havia processado no passado, e ao também ex-governador e atual deputado federal Paulo Maluf, que notabilizaram o rouba, mas faz.
Hélio Bicudo mudou de opinião, o que não é nenhum demérito. Vale a frase de Mahatma Ghandi: “temos de nos tornar na mudança que queremos ver”.




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