segunda-feira, 16 de maio de 2016

A solução para o movimento imigratório depende de nossas escolhas



Silvano Tarantelli

Uma onda imigratória varreu o mundo e vem alterando conceitos e provocando mudanças. Lances repletos de dramaticidade acompanham o drama dos imigrantes que precisam superar obstáculos quase intransponíveis em busca de novas oportunidades e das muitas vidas que foram perdidas, incluindo crianças.
Ao mesmo tempo, o fenômeno é dos mais importantes vetores de transformações do atual século, embora tenha sido assim no passado também, em crises após as duas guerras mundiais, por exemplo.
A tensão provocada por essa corrente imigratória vai continuar ao longo da História, enquanto houver fome provocada por catástrofes climáticas, conflitos alimentados por interesse escusos e apoio a regimes autoritários, que assassinam opositores e expulsam as pessoas de seus locais de origem.
É o principal desafio enfrentado pela humanidade no momento e seus efeitos irão repercutir nos campos econômico, político e cultural das nações que acolhem os imigrantes e refugiados. Sabendo enfrentá-lo o mundo saberá superá-lo.
De um lado, é preciso pressionar os governos para adotar  as medidas que vêm ensaiando e que são difíceis de implementar para minimizar os estragos causados pela interferência humana na natureza. Combater os efeitos sobre o clima causados pela emissão de gazes tóxicos na atmosfera, em busca de formas de energia limpas e menos poluentes.
De outro, enfrentar as causas e efeitos dos conflitos regionais e privilegiar uma cultura de paz e colaboração. Os efeitos do colonialismo, as tensões entre as superpotências e as imposições do capital e dos interesse econômicos provocaram efeitos negativos em diferentes continentes, inclusive na nossa América do Sul. Os impactos foram brutais: fronteiras foram impostas artificialmente e estados se desmancharam dando origem a outros.
Vencidos os ditames da polarização entre sistemas diferentes com o fim da guerra fria, os controles se tornaram mais sofisticados e complexos e provocaram mudanças inclusive nos grandes centros do poder, governados em nome da sociedade mas a serviço das grandes corporações, de amplitude global do capital internacional.
A crise enseja mudanças para o bem ou para o mal. Pode implicar na troca da política de submissão pela da cooperação entre os países. O poder econômico pela solidariedade. Ou ódio e a intolerância presentes entre alguns segmentos da sociedade vão se fortalecer. Nossas escolhas irão influenciar ou uma ou outra dessas tendências.
O fato é que as nações que se desenvolveram sem se preocupar com os efeitos que causaram sobre as outras estão agora presas na armadilha que criaram.  Os prejudicados estão batendo às suas portas vindos principalmente da África e do Oriente Médio.  Os governos europeus, por sua vez, estão como se poderia dizer em uma “sinuca de bico” sem saber como dar conta das centenas de milhares de refugiados e imigrantes, homens, mulheres e crianças que arriscam diariamente suas vidas cruzando fronteiras ou em embarcações precárias enfrentando longas travessias marítimas.
O movimento gera grandes correntes de solidariedade mas também origina a cultura de intolerância por parte de segmentos da população que vem se organizando e conquistando influência política.
A  extrema direita ganha força em algumas partes da Europa, como na Áustria, com a eleição recente de um governo cuja principal plataforma é impor limites ao ingresso de imigrantes no país.
Tomo conhecimento pela imprensa que imigrantes haitianos estão deixando o Brasil para se dirigirem ao Chile em busca de um país de economia mais estável.
Acompanhei a onda imigratória haitiana em São Paulo durante a sua crise mais aguda. Na época, trabalhava como responsável pela assessoria de comunicação da Secretaria estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania.
Dois fatores influenciaram a escolha dos haitianos pelo nosso país: primeiro, nossa influência como integrantes da missão de paz da ONU no Haiti e a imagem vendida pelo governo federal de um país próspero e com as portas abertas para a imigração. Faltou estrutura para receber os imigrantes, como se pode ver com o ingresso desordenado pela fronteira do Acre de pessoas que ficaram amontoadas em acampamentos improvisados e o envio como se fosse gado para outros estados, sem aviso prévio aos governos estaduais e municipais.
O Brasil sempre foi um país hospitaleiro. Embora isso também teve as suas conveniências e conseguiu fortalecer uma imagem. As primeiras ondas imigratórias europeias vieram substituir a mão de obra escrava, abolida alguns anos antes, na forma de trabalhadores assalariados. Registre-se que o nosso país foi um dos últimos a abolir a escravatura e só o fez sob pressão da Inglaterra, na época a maior potência econômica mundial, porque a escravidão era contrária aos interesses econômicos do Império e ao avanço das forças do capital.
A imigração, como se sabe, foi benéfica ao desenvolvimento econômico, e continua sendo. Os países que enxergam essa oportunidade se desenvolveram mais e em todos os sentidos.
Apesar de gente como Donald Trump que quer construir um muro  separando os Estados Unidos do México, alguns países souberam integrar os imigrantes à sociedade. E eles conseguiram se sobressair, em todos os campos. É o caso de Barak Obama, nos Estados Unidos, e de Sadiq Khan, em Londres. O primeiro, eleito o primeiro presidente negro da História norte-americana  e o segundo, o primeiro mulçumano escolhido pelos eleitores para ser prefeito de Londres. Os dois são filhos de imigrantes: de pai africano, no caso do presidente norte-americano, e asiático, origem dos familiares do britânico.
Com otimismo, creio que as soluções serão encontradas e a vontade política de resolver os presentes problemas vai prevalecer de forma satisfatória. Indo além, espero que possamos transformar em realidade a utopia sonhada por muitos humanistas: um país sem fronteiras, pode ser possível um dia. Vamos acreditar que sim.
Publicado originalmente no portal da Afropress http://www.afropress.com/post.asp?id=18938


 Foto: Museu da Imigração/autor ignorado.

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